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Dermatite de mãos devido ao trabalho

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As dermatoses com origem no trabalho são um problema, pois envolvem departamentos pessoais, relação patrão-empregado, SUS, benefícios previdenciários e muitas vezes são motivos para litigio.

O Dr. César Bimbi atua como perito judicial avaliando se um problema de pele se deve ou não ao trabalho. Além disso, faz parte do recentemente criado grupo de trabalho da Academia Europeia de Dermatologia – EADV sobre dermatoses ocupacionais. Nesse artigo, vários pontos chave e recomendações para resolver dermatites ocupacionais são esclarecidos. Confira:

Dermatite de mãos

Dermatite de Mãos é patologia comum, de diagnóstico simples, mas a resolução não é fácil. Cronifica e se torna severa, alterando radicalmente aparência e função da mão e repercute dramaticamente nas relações sociais, levando a estigmatização. A prevenção é tão importante quanto tratamento. Depende do reconhecimento de causas e da facilidade de consulta médica, sendo mais difícil quanto mais baixa classe social.

Muitos pacientes demonstram comprometimento funcional significativo da mão, diminuição da capacidade e não conseguem trabalho. Resulta afastamento prolongado e perda de emprego, com grave comprometimento na qualidade de vida. Estudo dinamarquês, baseado nos dados oficiais do Registro Nacional de Doenças Ocupacionais, acompanhou em 758 pacientes por 1 ano: 41% melhoraram; 25% tiveram situação agravada e 34% mantiveram um grau leve a moderado. (5)

Conheça os tipos de dermatite de mãos:

Dermatite de contato irritativa aguda

Por contato com irritante potente, como um ácido forte ou álcali, gerando edema e necrose das células da pele. Figura 4: isso precocemente após a exposição. Comum em mecânicos que lidam com ácidos, trabalhadores de cozinhas e limpeza, pelos produtos de limpeza. O afastamento do trabalho é obrigatório. O prognóstico é muito bom, mas podem ocorrer cicatrizes.

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Figura 1: dermatite irritativa em servente de obras.

Dermatite de contato por irritação cumulativa

Este é o tipo mais comum – resultado por irritantes cáusticos fracos: sabões, detergentes, sapólios, saponáceos, pinhos, etc. A repetição do contato não permite a pele recuperar-se, levando a dermatite persistente ou dermatite crônica. Agentes químicos, como óleos minerais ou de corte, sintéticos minerais e naturais, irritam a pele exposta por muito tempo e iniciam e perpetuam essa afecção de pele.

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Figura 2: Dermatite hiperceratótica e liquenificada em mecânico de manutenção, por ação de óleos minerais. Nesse caso, o paciente trocou de função e melhorou; voltou para função anterior e piorou. Quanto mais tardia a intervenção terapêutica e prevencionista pior a chance de se livrar em definitivo.
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Figura 4: ulceração nas mãos por ação caustica de agentes de limpeza em faxineira.
Figura 3: Dermatite hiperceratótica pode ser interpretada como psoríase; ocorre em trabalhos envolvendo fricção continuada
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Figura 5: Látex das luvas e os aditivos da vulcanização da borracha têm sido considerados como os sensibilizantes mais comuns nos profissionais da saúde em especial. É um erro comum na prevenção de contato com agentes químicos.

Ocupações com alta chance de dermatite incluem faxina e limpeza, pessoal de cozinha, construção civil, mecânicos, dentistas e auxiliares, enfermeiros, operadores de máquinas, esteticistas. Qualquer trabalho que envolva contato com produtos químicos repetido ao longo de horas aliado a umidade e necessidade de lavar as mãos mais de 20 vezes por dia (“trabalho úmido”) tem maior risco de causar dermatite nas mãos. (1)

Conduta prevencionista:

  • 1º – Quanto mais cedo a empresa afaste seu trabalhador do ambiente de trabalho, melhores as chances de cura definitiva, daí as recomendações medicas de afastamento de produtos químicos logo que detectada a dermatite. Paciente deve ser avaliado por dermatologista com foco em dermatologia ocupacional.
  • 2º – Hidratantes a base de ceramidas são valiosos na prevenção da dermatite de mãos ajudando a reparar a pele danificada. Eles devem ser aplicados repetidamente ao longo do dia e sempre que a pele fica seca.(2). Cremes do tipo luva invisível tem eficiência porém limitada, não podendo ser considerada isoladamente como eliminado o risco.(3)
  • 3º – Escolha da luva de acordo com a atividade; devem ser mantidas limpas por dentro através de higienização, e trocadas regularmente.
General guidelines to chemical resistance of glove materials Williams C1, Wilkinson SM, McShane P, Lewis J, Pennington D, Pierce S, Fernandez C.
  • 4º – Atentar sobre permeação e degradação (4). Permeação é um processo pelo qual um produto químico pode passar por um filme protetor sem passar orifícios ou outras aberturas visíveis. Moléculas da substância química entram e passam entre as moléculas da luva.  O material pode parecer inalterado, visivelmente. A permeação química pode ser comparada ao que acontece com o ar em um balão depois de várias horas: embora não haja orifícios ou defeitos, e o balão está hermeticamente fechado, o o ar atravessa gradualmente (permeia) suas paredes e escapa. Este exemplo simples usa permeação de gás, mas o princípio é o mesmo com líquidos ou produtos químicos. Degradação é uma redução em um ou mais propriedades físicas de um material de luva devido ao contato com um produto químico. Se um produto químico tem um impacto significativo nas  propriedades de um material de luva, sua resistência à permeação é rapidamente prejudicada.

Dúvidas frequentes:

Alergias de pele ocupacionais acontecem em trabalhadores alérgicos, sendo um problema individual?

Incorreto: a maioria das dermatites de mãos não tem nenhum mecanismo imunológico, se trata apenas de pessoas que trabalham com produtos mais irritantes do que a pele pode suportar; ou por muito tempo, ou sob pressão manual intensa. A dermatite não se deve a um estado alérgico prévio, necessariamente. A camada córnea da pele, a mais externa, é como um filme plástico funcional, complexo, que protege o tecido vivo logo abaixo, prevenindo seu ressecamento e agressões químicas, físicas e biológicas. Quando sofre agressão química acima do que pode neutralizar, o dano ocorre.  Substancias químicas fracamente irritantes, mas com exposição prolongada também geram eczema. Mesmo nos casos onde acontece alergia, esta ocorre secundariamente a uma lesão por substancia que irritou a pele. A dermatite pelo contato com óleos e outros agentes agressivos que descamam a pele, fazem com que a pele lesada acabe deixando passar outros elementos do dia a dia (perfumes de sabonetes, por exemplo, produtos caseiros de limpeza etc… ), pois a pele perde a higidez e a impermeabilidade.

Quanto tempo pode levar para o aparecimento da dermatite?

É muito variável. Pode levar dias ou semanas ou pode levar meses. Depende de fatores de tempo de contato, tipo de protetor usado, tipo de movimento feito (pressão do produto contra a pele é pior).

Afastado do ambiente laboral há vários meses, portanto cessado o contato com qualquer substancia lá existente como explicar a permanência do quadro clinico?

É errado pensar que a demissão trabalho vá resolver a dermatite espontaneamente. Mesmo afastado do trabalho a dermatite pode persistir, o que é comum. Um trabalho na British Journal of Dermatology (1) envolveu 213 pacientes com DM irritante primária aos quais foram enviados questionários após 1-16 anos do tratamento de sua dermatite: apenas 30,8% tiveram remissão completa da dermatite, enquanto 69,2% apresentaram doença contínua ou intermitente. Dos pacientes que mudaram de ocupação, apenas 32,8% tiveram remissão completa de sua dermatite, contra trinta e sete 29,8% que continuaram sua ocupação após o diagnóstico de dermatite de mão irritante primária. “Parece que o prognostico não é favorável, mesmo após 10 anos, e a mudança de ocupação não tem efeito significativo”,conclui o estudo.

Como atribuir ao trabalho quando atividades na própria residência também expõe a detergentes e outros produtos de limpeza em geral?

Pode ocorrer algum efeito das funções domésticas, porém haveria que se considerar o tempo de limpeza da casa, bem menor que o tempo de exposição em ambiente profissional a agentes de limpeza. Além disso produtos de limpeza de uso industriais tem fórmulas a base de agentes mais agressivos comparativamente aos que se usa em casa.

Existe um pH limite de causticidade dos produtos químicos, que defina o risco a pele?

O termo causticidade é relativo e se refere a capacidade de necrosar tecidos sendo que na dermatite aguda por irritantes primários (soda, ácidos) a destruição tecidual se dá ao modo direto e imediato enquanto na dermatite por irritantes (produtos de limpeza, óleos , solventes) ela leva semanas a meses. Nas 2 situações, se olharmos amostras de pele da biópsia as células epidérmicas mostram o mesmo padrão histológico e edema intracelular e intercelular (espongiose) que gera necrose, que é o resultado final da causticidade. Um pH menos alcalino também pode lesar e ter efeito cáustico na pele. (https://emedicine.medscape.com/article/1049353-workup#c11)

Como distinguir uma dermatite alérgica de uma irritativa?

A distinção nem sempre é possível. Prurido como sintoma não é confiável na distinção entre causação alérgica e irritante na fase crônica. A maioria das vezes a dermatite por irritantes induz uma reação alérgica superposta.

Dermatite atópica e eczema e dermatite é a mesma patologia?

Dermatite atópica ocorre desde a infância, no geral acompanhada em algum tempo de asma ou rinite alérgica; são patologias distintas.

Fontes:

1.British Journal of Dermatology The outcome of primary irritant hand dermatitis K. KECZKES  S.M. BHATE  E.H. WYATT doi.org/10.1111/j.1365-2133.1983.tb00547.x

2. British Association of Dermatologists (BAD): http://www.bad.org.uk/ hand dermatitis

3.Bauer A, Rönsch H, Williams H, et al. Interventions for preventing occupational irritant hand dermatitis. The Cochrane Database Of Systematic Reviews [serial online]. April 30, 2018;4:CD004414

4..Permeation/Degradation Resistance Guide Ansell Chemical Resistant Gloves

www.ansellpro.com/download/Ansell_8thEditionChemicalResistanceGuide.pdf

5. Prognosis of occupational hand eczema: a follow-up study.Cvetkovski RS, Zachariae R, Jensen H, Olsen J, Johansen JD, AgnerT.ArchDermatol. 2006 Mar;142(3):305-11.

Agradecimento:

Fotos 3, 4 cortesia Prof. Sandy Skotnicki medica dermatologista service Pericias Médicas dermatologicas, Workplace Safety and Insurance Appeals Tribunal, Toronto, no Allergic Contact Dermatitis versus Irritant Contact Dermatitis The Workplace Safety and Insurance Appeals Tribunal May 2008 Dr. S. Skotnicki-Grant University of Toronto  Division of Dermatology and Occupational Health  St. Michael’s Hospital (http://www.wsiat.on.ca/english/mlo/allergic.htm)

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